Tópicos para um possível testemunho




Ø Em que ano frequentou o liceu?

Ø Que curso frequentou?

Ø Não esta arrependida pela sua opção?

Ø Fale-nos um pouco da sua passagem pela nossa escola?

Ø Como eram os tempos naquela altura? Eram muito diferentes dos de hoje?

Ø Acha que houve evolução da sua geração para a nossa?

Ø Tem algumas recordações e documentos, da sua passagem pelo liceu?

Ø Como era o ensino nessa altura?

Ø Ainda mantém contacto com colegas de turma? Ou com professores?

Ø O que seguiu após a sua passagem pelo liceu?




Este são os nossos tópicos que o podem ajudar na criação de um texto para testemunhar a sua passagem cá pela escola. Agradecemos a sua resposta para prosseguir-mos com o nosso trabalho.

P.S: Se nos pudesse mandar uma fotografia junto agradecíamos imenso.
Obrigado pela sua colaboração para o nosso projecto.

domingo, 29 de março de 2009

Testemunho de Henrique Duro

Proezas na adolescência

Era aluno do 5ºano do Liceu.
O Liceu daquele tempo não é o que é hoje. Mas, … oh se deixa saudades, o Liceu e aqueles tempos. Podem crer que também iriam gostar, se pudessem viajar ao meu passado. Mas, vou aliciar-vos com um pequeno registo das muitas memórias, que tenho, e que, todos vós, no amanhã, tereis, como se tem a idade.
O Liceu
Os alunos do liceu podiam obter dois diplomas, o diploma do 5º Ano e o diploma do 7º Ano.
O 5º Ano, do meu tempo, estava dividido em duas Secções: Letras e Ciências. A Secção de letras contemplava quatro disciplinas: Português, História, Inglês e Francês. Da Secção de Ciências faziam parte as disciplinas de Ciências, Geografia, Física, Desenho e Matemática.
Para concluir o 5ºano era necessário obter classificações positivas nas disciplinas de cada Secção. Caso contrário, repetiria todas as disciplinas, mesmo aquelas em que já tinha dado provas de saber, no ano seguinte, até conseguir.
Agora falo-vos da minha irreverência e do espírito de união que existia nos alunos.
Aconteceu na disciplina de Ciências. A professora, que já cá não está entre nós, era a Maria João. Era teste. A manhã estava linda de sol, “bué de bonita”. Na véspera, o aluno mais velho, de 19 anos, o Armindo, que vivia longe do estudo, mas precisava de acabar o 5º Ano, para ir trabalhar, deu-nos a conhecer o plano que tinha para conseguir copiar. A sala, que era sempre a mesma, era pequena, cheiinha de alunos, com uma porta de entrada, outra porta no fundo da sala, que não abria. Não havia grandes hipóteses de copiar naquela sala pequena e com tanta gente. Por debaixo das portas ninguém conseguiria fazer chegar o saber. Primeiro, porque não tinham o enunciado e segundo, porque o funcionário, o Sr. Silva, patrulhava os corredores. A única entrada para vir a ajuda do exterior teria de ser pela janela. E foi.
A sala de aula e de teste era no 3º piso, por cima da actual sala dos professores, que na época era a sala de desenho. Para vencer a barreira da altura sugeri usar o carreto da cana de pesca da truteira que o meu pai usava na pesca à truta. Perplexos, os meus colegas, perguntaram como é que ia fazer. Eu estava numa posição privilegiada porque estava lá atrás junto à janela. Então expliquei-lhes que, antes do teste, colocaria o carreto debaixo da carteira, aquela antiga carteira, e desceria a linha, “sediela”, com a qual içaria os testes. A ideia mereceu a aprovação de todos.
Quem faria chegar o enunciado ao exterior?
O Armindo estava na primeira carteira, ao lado da janela da frente, bem pertinho da professora. Conto-vos que a professora era novinha, simpática e muito bonita. O Armindo era o mais velho, já com barba e corpo feito. Teria que ser ele, o mais arrojado, a lançar o enunciado pela janela. E foi ele mesmo.
Quem nos faria os testes?
O Armindo combinou com os colegas do 6º e 7º Ano para completar o nosso plano. Então, logo que tivessem o enunciado, correriam para a Quinta, essa que vocês vêem, e debaixo do arvoredo, cada um com a sua folha de teste, rapidamente o fariam. Depois faziam um rolo com 24 testes, atavam a linha e dariam três assobiadelas, sinal que tudo estava pronto. E assim foi.
Como distrair a professora?
Combinei com o Eugénio, irmão do Armindo, que estava sentado na carteira encostadinha à porta de trás, na direcção da “minha” janela, que quando eu tossisse 3 vezes ele chamaria a professora, para esclarecer uma dúvida qualquer, que não teria. Sereia o momento exacto para fazer subir os testes. E foi.
No dia do teste
O Armindo, logo que recebeu o enunciado, amachucou-o e lançou-o pela janela. Um aluno do 7º Ano apanhou o enunciado e correu para a quinta. À espera estavam os muitos colegas para resolver e escrever o teste nas folhas de teste. Três dos colegas mantinham-se vigilantes, não fosse aparecer repentinamente o Sr. Silva. Concluídos os testes, fizeram um rolo e ataram-no bem atado. Depois um colega caminhou calmamente debaixo da janela e para junto da linha e sentou-se no chão folheando um livro. Os outros alunos foram chegando, um após outro, junto às árvores, perto das salas contentores, e iniciaram uma brincadeira com uma bola de futebol, de plástico, como forma de diversão.
Ouvi as três assobiadelas e de imediato tossi três vezes. O Eugénio chamou a professora. Eu, fiquei tenso, mas estava determinado e lancei mãos à obra. Meti as mãos debaixo da carteira, segurei o carreto e iniciei o movimento de enrolar. Que susto. Como tinha o carreto travado ele respondeu com um tric, trac, tric, trac, quando dei à manivela. A professora virou-se e procurou perceber aquela barulheira. Os meus colegas de cabeça em baixo tentavam fazer que faziam o teste, nervosos por não saberem se a estratégia resultaria, o que a não acontecer seria um desastre a Ciências. O Eugénio insistiu, a professora deu-lhe atenção e ficou de costas para mim. Aproveitei o momento, rapidamente destravei o carreto e fiz subir o rolo de testes.
A subida do rolo de testes era observada pelos colegas que estavam debaixo das árvores. O rolo ao passar de janela em janela, até chegar à minha, causava espanto. Que o digam os alunos e o professor Cruz Gomes, que estavam na sala de desenho e viram estupefactos aquele rolo a subir. Quando foram à janela ver se viam alguma coisa, já nada viram. Lá pensaram que era algum óvni em miniatura. Mas, muito confusão naquelas cabeças, isso sim, deve ter criado.
Eu olhava de soslaio enquanto fazia subir os testes. De repente vejo o volumoso rolo de testes preso ao tubo de escoamento de águas que estava no parapeito da janela. Naquele momento o meu coração vacilou. Se puxo o volumoso rolo de testes podia a linha ceder, rebentar, e os testes desceriam como as folhas das árvores, uns por cada lado. Se me levanto e vou buscá-los, a professora ver-me-ia, e todo o nosso esforço teria sido em vão. Numa decisão rápida, do seja o que Deus quiser, dei um puxão e o rolo saltou-me para cima da carteira. Meti o rolo debaixo da carteira, lancei mão de um pequeno canivete vermelho, que cortava muito bem, dilacerei o cordame, o rolo abriu, e comecei a enrolar o rolo ao contrário para endireitar as folhas de teste. Depois fui passando testes para trás, para a frente e para o lado. O meu colega Alfredo levantou-se e foi colocar uma dúvida à professora para permitir a distribuição mais rápida dos testes. O colega Aguiã deixou cair a folha ao chão, propositadamente, pediu licença para se levantar e apanhá-la. Foram momentos de distracção preciosos para que os testes pudessem chegar a todos os alunos.
Já mais calmo de tamanha azáfama, vejo a professora levantar-se da secretária, e por momentos esqueci tudo o que tinha passado, até mesmo o teste, e olhei-a com um olhar profundo e terno. Eu já tinha escrito o nome na folha de teste, que, aleatoriamente, tinha deixado para mim.
Na carteira à minha frente sentava-se o Zé António. Era magrote, usava óculos com lentes quase de fundo de garrafa, e era um pouco “atado”. A professora estava a observar o Zé António. Depois, aproximou-se dele e confrontou-o com os dois testes que ele tinha na mão. Um desses testes era um dos que os colegas tinham feito na quinta, e que tanto trabalho tinha dado até chegar às mãos dele. A professora, enfurecida, perguntou-lhe quem lhe tinha feito aquele teste. Ele ficou sem palavras e não respondeu. O interessante é que o Zé António tinha dois testes escritos, um a azul e o outro a preto. Que pouca sorte a dele, como estava a escrever a azul, a professora tirou-lhe o teste escrito a preto.
Eu era um bom aluno, estava a escrever a preto, não pude fugir à ira da professora e ela acusou-me de eu ter feito o teste ao Zé António. Por momentos, pensei que me anularia o teste.
Uns dias depois vieram os resultados e a professora estranhou que todos tivessem estudado muito, mas mesmo muito.
Recordo estas e outras peripécias, que fazem parte da alegria de viver de cada um de nós, com alguma regularidade.

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